Eu acho que os entardecidos têm pena de si mesmos. Digo isto porque as conversas entre eles são sobre seus incômodos, doenças, dores, indicações de chás, unguentos e remédios. Cada um é médico amador em particular, a propalar as eficácias disto ou daquilo. Por exemplo, eu conheço alguém que tomou chá de sabugueiro e não é que ficou bom daquela dor que o incomodava! E porque você não experimenta cibalena, é tiro e queda! Nem sempre, eles são alertados pelo desconfiômetro e se perdem horas e horas contando os seus males e curas miraculosas. Este tipo de conversa é um porre! Principalmente, para os mais jovens que, normalmente, não têm aporrinhações nesta área, onde o disco furado nunca é desligado, em conversas infindas sobre as surradas mesmices.
O que tenho eu, meu caro leitor, de estar aqui incomodando-o sobre um tema que somente interessa para quem é velho e se deleita em contar os seus males para todo aquele que se dispuser a ouvi-los! Pois é, a convivência seria mais salutar se se saísse de dentro de si a divagar sobre uma imensidão de temas, pois no outono da vida se é como Banco do Brasil: tem história para contar! Então, conte-as.
Divague sobre a vida, sobre sucessos e vicissitudes. Sobre as maravilhas e as misérias deste mundo composto: de dor, de alegrias e de surpresas. Sobre a esperança e sobre o futuro. Treine os mais jovens na sublime arte de ouvir! Enfim, tem tanta coisa para se dizer e relatar para deixar um testemunho do que se foi e do que se fez. Em tempos mais remotos, se cultuava os contadores de histórias, os cronistas do cotidiano. As crianças, não saíam dos pés dos mais velhos. Tudo isto pode ser resgatado, com um pouco de boa vontade, para fazer os pequenos se interessarem por livros e histórias incríveis e fantásticas, desenvolvendo as suas imaginações férteis. Este legado, certamente, irá para o túmulo, se não for transferido para as gerações futuras.
Não se sinta ofendido, com o mundo, por estar aí sentado girando em círculo num solilóquio masoquista ou num colóquio de repetição, procure novas coisas, encontre as pessoas, viaje se puder, faça um novo começo, descortine um novo panorama, conte histórias para as crianças que elas irão adorar. Seja útil, faça um fim glorioso, pois se ele é inevitável, faça uma festa para encontrá-lo. Meu caro, tristeza sequer paga dívidas!
Diminua os seus comentários sobre os males que o afligem, pois isto é normal no outono da vida. Os mais novos sequer têm noção disto. Se você for mais jovem não os antecipe, não sofra por encomenda, pois cada idade com as suas alegrias, tristezas, males e satisfações.
Quando eu era criança, lá da cidadezinha de onde eu vim, tinha um Senhor a quem a minha mãe perguntava: Como vai o Senhor? E ele respondia: Dona Adalgisa, uma DORZADA! Eu me lembro dessa palavra, inventada por ele, para não aporrinhar as pessoas com queixas e mais queixas que somente interessam a quem as tem.
Renato Gomes Nery. E-mail – rgnery@terra.com.br