O Brasil é um Estado de Direito Democrático. O artigo 5º da Constituição Federal assegura ao cidadão os direitos e garantias individuais, ao regulamentar o postulado de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. E daí decorre que ninguém é obrigado a fazer alguma coisa senão em virtude da lei. A base, portanto, do nosso regime político está na observância, por todos, sem distinção, aos mandamentos legais.
O juiz somente pode decidir com fundamento e respaldado em dispositivos legais. O poder discricionário de um juiz é mínimo e mesmo assim dentro dos parâmetros legais. Qualquer autoridade ou agente público, não pode fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei. O Brasil de uma forma geral está inflacionados de decisões e tomadas de posições e atitudes de autoridades e agentes públicos fora destes parâmetros legais. E não é sem tempo o posicionamento do Supremo Tribunal Federal para trazer os juizes ao leito comum da observância dos preceitos legais nas suas decisões. Bem como a reação conjunta do Presidente do STJ e do Presidente da República para limitar os poderes dos agentes e autoridades públicas, a fim de coibir abusos e desvios que vem sendo cometidos.
Temos aqui no Estado de Mato Grosso, uma situação recente que demonstra bem este quadro. Um juiz eleitoral com base em meros indícios determinou a busca e apreensão de material eleitoral nas casas de candidatos e escritório de advogado. E se os indícios fossem comprovados, o crime no qual os candidatos estavam sujeitos era apenas a multa. Somente a pena do crime demonstra a temeridade da busca e apreensão. O Delegado da Polícia Federal encarregado do cumprimento da ordem, montou uma monumental operação de guerra e invadiu de madrugada as casas dos candidatos a procura do tal material de campanha ou seja supostos “santinhos” fora das especificações legais. Não encontrou nada em lugar nenhum. Se tivesse encontrado, o Sr. Delegado, não teria vindo a público para dizer que não avisou a imprensa e que a ordem foi motivada pelos adversários, com vistas a proveito político. Não falou, também, que ele não precisava cumprir ordem judicial de madrugada afrontando famílias, vizinhos e a comunidade, mesmo por que nenhum dos réus na ação era bandido que estava prestes a evadir.Não falou, também, que a espetacular publicidade das ações policiais não estava prevista em lugar nenhum. Se tivesse encontrado alguma coisa a conversa seria outra e o Ilustríssimo Senhor Delegado, aparecia na imprensa com poses de herói.
Um outro posicionamento é preciso e urgente que seja tomado para coibir incidentes como o aqui relatado e um deles é responsabilidade civil direta de qualquer autoridade ou agente público pelos seus atos ou seja se autoridade ou agente público causar dano de qualquer natureza estará responsável diretamente em repará-lo. E há base para isto no nosso ordenamento jurídico. Enquanto, os custos pelos desvios e os abusos estiverem sendo suportados pelas “costas largas” do Estado, não se terá, por parte dos responsáveis, a parcimônia e o bom senso na tomada de decisões e atitudes que atinjam direitos do cidadão que todo aquele que ganha dos cofres públicos tem o dever de preservar. Não se pode mais tolerar que agentes e autoridades públicas espalhem a cizânia, destruam reputações, desestruturem famílias e apareçam aos olhos da sociedades como justiceiros e heróis.
Renato Gomes Nery é advogado e ex-presidente da OAB/MT.